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Saúde Para O Povo? Para Um Entendimento Da Economia Política E Das Dinâmicas Da Descentralização No Sector Da Saúde Em Moçambique
Resource type
Author/contributor
- Weimer, Bernhard (Author)
Title
Saúde Para O Povo? Para Um Entendimento Da Economia Política E Das Dinâmicas Da Descentralização No Sector Da Saúde Em Moçambique
Abstract
Houve em 2011 três acontecimentos que revelaram as dimensões dos desafios
que se colocam à gestão do Sistema Nacional de Saúde moçambicano em geral
e ao Ministério de Saúde (MISAU) em particular. O primeiro foi uma auditoria
externa das contas de 2009 do PROSAUDE II e do Fundo Global, realizada
pela empresa de auditoria KPMG e entregue ao governo e aos seus parceiros
internacionais em Junho de 2011. Esta auditoria revelou fraquezas consideráveis,
nomeadamente em relação à auditoria interna e uma substancial diferença final
não reconciliada entre os valores recebidos e os pagamentos efectuados.
O segundo foi a crise de abastecimento de medicamentos, amplamente divulgada
dos produtos farmacêuticos, quando os meios de comunicação noticiaram, num
período de Março a Julho, que, no armazém farmacêutico central do MISAU, o
CMAM,49 em Maputo, havia medicamentos no valor de pelo menos 2 milhões
de USD que estavam fora de prazo; que os medicamentos se tinham esgotado
nos hospitais públicos na Zambézia; e que grandes quantidades de medicamentos
tinham desaparecido da farmácia do Hospital Central de Nampula.50 Os
doadores recusaram um pedido de um montante adicional de 25 milhões de
dólares para reabastecimento de medicamentos, feito pelo Ministro da Saúde em Março de 2011, argumentando que o governo teria que abordar e resolver as
questões pendentes dos resultados da auditoria de 2009, antes de os doadores do
PROSAUDE assumirem quaisquer compromissos de financiamento adicionais.51
Em terceiro lugar, pouco antes do fim do ano, o pessoal da saúde na Cidade de
Nampula, incluindo os médicos, ameaçaram fazer greve, se não lhes fossem pagos
os salários, três meses atrasados.
Estes acontecimentos põem em relevo, em síntese, alguns dos principais
desafios com que a gestão do sector da saúde se debate em Moçambique. Não se
sabe até que ponto estes acontecimentos e o que eles revelam sobre a gestão de
recursos no sector da saúde afectaram o funcionamento das unidades de saúde
nas províncias e distritos, e o impacto sobre a saúde das pessoas doentes e da
população em geral. Estas unidades dependem crucialmente de recursos (pessoal,
financiamento e medicamentos) para o cumprimento da sua missão de controlar
a doença e salvar vidas humanas, ou seja, para produzir os resultados de saúde que
lhes compete alcançar, muitas vezes medidos com o indicador DALY.52
Neste artigo, não tentaremos avaliar o impacto das práticas de gestão no sector
da saúde e os seus resultados em termos de vidas humanas. Tentaremos antes
entender as dinâmicas políticas, económicas e institucionais que influenciam os
resultados de saúde e o desempenho das unidades de saúde ao nível subnacional
em Moçambique.
O nosso argumento é que estas variáveis são determinadas não apenas por
factores endógenos ao sector de saúde, como sejam as suas políticas e quadro
regulamentar, a sua estrutura institucional, o grau de descentralização, e ainda os
recursos que lhe são atribuídos e as suas capacidades de gestão. Também há factoresexógenos, como as decisões orçamentais do Ministério das Finanças, a Ajuda ao Desenvolvimento da Saúde (ADS)53 por parte dos doadores e as suas políticas
e mecanismos de atribuição de fundos, como a abordagem sectorial integrada
(SWAp)54 e o financiamento conjunto, bem como a mudança social e económica
e as formas de governar um país, que produzem impactos decisivos no sistema de
saúde e nos seus resultados. No que diz respeito à temática da descentralização
da saúde, partimos, em primeiro lugar, do princípio que os ‘objectivos gerais da
descentralização e a abordagem sectorial não são incompatíveis’, uma vez que
tanto os primeiros como a segunda ‘têm por objectivo aumentar a eficiência
técnica; incentivam uma maior participação; e põem a tónica na transparência
e prestação de contas’ (Hutton, 2002: 3. Original em inglês). Em segundo lugar,
chamamos a atenção para a necessidade de reconhecer um papel forte e normativo
do Estado central nas políticas de saúde, na sua gestão, supervisão e questões
de equilíbrio social, especialmente em matéria de cuidados de saúde primários,
uma vez que a descentralização pode levar à diferenciação e à diversidade e não ao reforço da justiça social nos padrões e no acesso às unidades de saúde
(Collins & Green, 1994). Como Booth sugeriu, o papel do Estado central é
fundamental, nomeadamente em institucionalizar e supervisionar, do topo para a
base, a disciplina de desempenho eficaz na componente de recursos humanos e na
produção de serviços de qualidade a nível local (Booth, 2010: 34).
Para este artigo, optámos por usar um quadro da análise político-económica
para examinar alguns dos determinantes endógenos e exógenos. Do ponto de
vista conceptual, a análise da economia política e da descentralização no sector da
saúde pode ser estruturada de várias maneiras. Uma, é analisando as mudanças de
epidemiologia, de características biomédicas dos corpos humanos e de ocorrênciaschave nos ciclos da vida humana (por exemplo, a fertilidade, a morbilidade ou mortalidade) como resultantes de intervenções por parte das instituições do sector da saúde, em condições sociais, económicas, ambientais e culturais em mudança.
Esta abordagem é muitas vezes centrada na pobreza e assenta no pressuposto de
que as mudanças institucionais, como a descentralização da prestação de serviços
de saúde, conduzem a um aumento do bem-estar e a uma melhoria da saúde nas
sociedades, se as intervenções institucionais (planos, programas, prestadores de
serviços, etc.) forem ‘correctos’ e dispuserem de suficientes recursos financeiros e
humanos, e capacidades, bem como de um quadro adequado de políticas. Dessa
forma, julga-se que as taxas de fertilidade e mortalidade acabarão por diminuir,
que as doenças infecciosas serão controladas e podem ser alcançados outros
progressos no combate à pobreza e à doença (O’ Laughlin, 2010: 7).
Book Title
Moçambique: Descentralizar o Centralismo? Economia Política, Recursos E Resultados
Place
Maputo, Moçambique
Publisher
IESE
Date
2012/09
Language
pt
ISBN
978-989-8464-12-5
Accessed
2023-03-14
Library Catalogue
Zotero
Citation
Weimer, B. (2012). Saúde Para O Povo? Para Um Entendimento Da Economia Política E Das Dinâmicas Da Descentralização No Sector Da Saúde Em Moçambique. In Moçambique: Descentralizar o Centralismo? Economia Política, Recursos E Resultados. IESE. https://www.iese.ac.mz/lib/publication/livros/Descent/IESE_Decentralizacao_4.3.SauPov.pdf
Themes / Temas
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Geography / Geografia
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